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Quando a pesquisa vai longe

Educação

Texto Greici Audibert*

 

Na visão de Paulo Freire, o patrono da educação brasileira, as pessoas só aprendem quando o ensino parte das suas próprias realidades. Esse também é o pensamento do pesquisador argentino Jorge Santos, bolsista de Pós-doutorado da Unochapecó. Professor da Universidade de Buenos Aires, desde 2016 ele também divide sua morada com Chapecó, onde pesquisa o processo de ensino nas comunidades indígenas. O estudo tem como base o curso de Licenciatura Intercultural Indígena da Instituição, o primeiro ofertado na região Sul do país com a finalidade de formar professores para as escolas exclusivamente voltadas à educação dos índios.

A segunda turma vai se formar esse ano e Sirlene Néris, que na língua kaingang se chama Jagniri, está entre os acadêmicos. Seu filho mais novo, kapīr, tem cinco meses e o nome não foi escolhido por acaso. Assim como muitos elementos da cultura dos índios, carrega toda uma simbologia especial. Kapir quer dizer árvore e representa uma pessoa forte, que das lutas retorna como raíz para renascer mais forte ainda. A filha mais velha, de dois anos, se chama fesī, que significa coração pequeno, para que ela seja doce, meiga e sempre queira ajudar o próximo. 

Para quem está de fora, essa bonita interpretação dos nomes pode parecer algo muito simples. Para os índios, porém, marca profundamente a vida e a história das gerações. Além de ser um exemplo muito elucidativo de como os modos de ser e pensar se diferenciam entre um povo e outro. Com raízes ainda mais profundas quando se trata da sabedoria indígena.

É por isso que a cultura está diretamente associada aos conteúdos pedagógicos das escolas localizadas nas aldeias de todo o Brasil. Uma bandeira levantada por Paulo Freire e hoje um direito garantido por lei, contribuindo cada vez mais para a inserção de professores também indígenas nas salas de aula. "A Unochapecó está dando uma oportunidade para pessoas que queriam passar seus conhecimentos adiante, mas não sabiam como. São pessoas que estudam, têm uma disposição para a educação. E não teriam possibilidade se não fosse a Universidade. Estou muito feliz em poder colaborar com esse programa, que acho muito valioso para a região e para outras pessoas que buscam oportunidades", avalia Jorge.

O professor trabalha com filosofia intercultural, com atuação em setores populares da Argentina, principalmente naqueles com migração de indígenas. Desde que iniciou o pós-doutorado, passa seis meses em Chapecó e seis meses em Buenos Aires. Em 2018 entra na fase final de sua pesquisa, vinculada à bolsa de pós-doutoramento pelo Programa Nacional de Pós-Doutorado (PNPD) da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes).

 

Estudos de alto nível

Atualmente, dois professores atuam como bolsistas de pós-doc na Unochapecó. Além de Jorge, do Programa de Pós-Graduação em Educação, outro pesquisador desenvolve seu projeto junto ao Programa de Pós-Graduação em Ciências Ambientais. São bolsas que promovem a realização de estudos de alto nível, reforçam os grupos de pesquisa nacionais e promovem a inserção e integração de pesquisadores brasileiros e estrangeiros através dos projetos desenvolvidos no país. No caso dos professores de fora do Brasil, a parceria ainda estabelece um mecanismo de apoio a estudos, proposição de novos projetos, intercâmbios e possibilidades de reflexão e atuação nas áreas exploradas.

"Tal apropriação de conhecimento e as diversas trocas de experiências realizadas nas inserções internacionais possibilitam aprimoramento contínuo, maturidade acadêmica e expertise", acrescenta o diretor de Pesquisa e Pós-Graduação Stricto Sensu da Unochapecó, Cláudio Machado Maia. Já quem está lá na essência da pesquisa, como a professora Sirlene, que provavelmente vai vivenciar os resultados do estudo, vê esse movimento como fundamental para aprimorar os processos de aprendizagem. "É gratificante ver que as pessoas estão buscando aprimorar os métodos de ensino e que as nossas escolas têm professores capacitados e indígenas. São eles que conhecem a realidade do educando, a realidade da nossa comunidade e, principalmente, conhecem a educação escolar indígena", entende a acadêmica.

E como ninguém nasce feito e é experimentando-nos no mundo que nós nos fazemos - assim disse Paulo Freire - a jovem Sirlene, inspirada nas andanças de Jorge, já busca orientação para seguir o estudos e ingressar no mestrado. Um exemplo muito claro de que os reflexos da integração entre povos, estudos e pesquisadores podem ir bem mais longe do que se imagina.

 


*Jornalista do Núcleo de Produção de Conteúdo (NPC) - Unochapecó
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