Potencialidade do uso da própolis na Medicina Veterinária

Parte 1: Ovinocultura

17/07/2020
Por: Thaisa Pavan Batiston

A criação de pequenos ruminantes no Brasil tem importância socioeconômica, sendo expressa por um rebanho composto por mais de 22 milhões de cabeças. A população de rebanho ovino na região sul de acordo com o último censo agropecuário é de 3.304.397 milhões de cabeças (NOBREGA, 2018). 

Um dos problemas sanitários comumente encontrados na ovinocultura é a pododermatite infecciosa, esta é uma enfermidade causada principalmente pela associação de duas bactérias anaeróbicas: Fusobacterium necrophorum e Dichelobacter nodosus, sendo esta última responsável pela transmissão (CARVALHO et al., 2012). 

A pododermatite é uma infecção limitada ao tecido epidérmico do espaço interdigital na pele e no casco, podendo afetar mais de uma pata e em casos mais graves os animais utilizam três patas ou pastam de joelhos. Essa dificuldade de locomoção para se alimentar traz uma série de consequências para o animal como o emagrecimento, que pode torná-lo suscetível a outras doenças e levá-lo ao óbito (SANTANA et al., 2008).

Fatores relacionados à alimentação, idade, intensificação da exploração, às más condições de manejo e do ambiente, como temperatura, umidade e tipo de solo, são importantes no desenvolvimento da pododermatite infecciosa, pois podem propiciar condições favoráveis para o desenvolvimento da doença (JESUS et al., 2017).

Quando a doença se instala no rebanho, ocorre a desvalorização dos animais que podem não ser utilizados para reprodução e apresentando dificuldade de comercialização, havendo muitas vezes o descarte dos animais que possuem alto valor zootécnico, sendo sempre o mais indicado prevenir a doença (SANTANA et al., 2008). Na ovinocultura a pododermatite conhecida também como footrot é um dos gastos mais dispendiosos, com produtos para pedilúvio, vacina, medicamentos e mão de obra. 

As principais práticas de manejo que devem ser adotadas nos rebanhos ovinos são limpeza das instalações, desinfecção do aprisco, corte e desinfecção do umbigo do recém-nascido com iodo a 10%, casqueamento, enterro ou cremação dos cadáveres, separação de animais enfermos, divisão de piquetes (TEIXEIRA et al., 2015) e o uso de pedilúvio (COELHO et al., 2011).

Nos últimos anos têm-se realizado uma busca com maior avidez, baseada na biodiversidade de plantas e animais, por recursos genéticos e bioquímicos que possam ser modificados ou que apresentem moléculas bioativas com potencial farmacêutico. Ainda que a maioria das pesquisas seja relacionada à atividade de produtos vegetais, produtos de origem animal têm conquistado espaço, tais como, os originados do metabolismo das abelhas, principalmente o mel, própolis e cera (BASTOS et al., 2011).

A própolis está sendo utilizada frequentemente na área da medicina humana e animal, trata-se de uma medicina alternativa, chamada de Apiterapia devido às suas várias propriedades terapêuticas e biológicas, em trabalhos científicos do mundo inteiro (COELHO et al., 2010).

Seu uso na medicina popular se deve pelas suas propriedades biológicas tais como: antimicrobiana, antioxidante, antiinflamatória, imunomodulatória, hipotensiva, cicatrizante, anestésica e anticarcinogênica (PARK et al., 2002). A composição é muito variada de acordo com a região e o potencial de coleta pelas abelhas, mas em geral a própolis é composta por resina (50%), cera e óleos aromáticos essenciais (30%), misturada com secreção salivar de abelhas (10%), pólen (5%) e outras substâncias (5%) como aminoácidos, minerais, etanol, vitamina A, B, E, e uma mistura de bioflavonóides (PARK et al., 2002; BASTOS et al., 2011).

A propriedade antimicrobiana da própolis é amplamente relatada, sendo destacada sua ação sobre Staphylococcus aureus (FERNANDES JUNIOR et al., 2003; PINTO et al., 2001); Streptococcus pyogenes (BOSIO et al., 2000); Candida sp (SFORCIN et al., 2000; STEPANOVIC et al., 2003) e sobre inúmeros outros microrganismos (BANSKOTA et al.,2001). Foi verificado também que bactérias Gram positivas se mostram mais sensíveis que as Gram negativas aos extratos de própolis (PINTO et al., 2001).

O estudo realizado por SILVA SOBRINHO et al. (2004) verificaram regressão das lesões, após o tratamento de 15 dias com própolis em pododermatite necrótica ovina. CUSHNIE & LAMB (2006), verificaram que a atividade antimicrobiana da própolis possui mecanismos de ação que apontaram inibição: da síntese de ácido nucléico, das funções de membrana citoplasmática, do metabolismo energético, além de constatar ausência de toxicidade da própolis. YANG et al. (2007), verificaram efeitos antibacterianos tanto em bactérias Gram positivas como negativas, porém as primeiras apresentaram maior sensibilidade e o efeito dependente da região na qual a própolis é coletada.

Muitos trabalhos vêm avaliando a atividade antimicrobiana da própolis e condições de manejo. É muito importante o estudo e o desenvolvimento de novas ferramentas para diferentes usos, como no tratamento da pododermatite que possui forte impacto econômico e de bem estar animal. Verificar o efeito da origem da própolis pode ser uma estratégia a ser utilizada devido ao aumento da resistência bacteriana contra antibióticos comumente utilizados na pododermatite e as mudanças de virulência e perfil antigênico dos patógenos que apresentam relevância clínica e ecológica (JESUS et al., 2017).

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BANSKOTA, A.H. et al. Review article – Recent progress in pharmacological research of propolis. Phytother Res, v.15, n.7, p.561-571, 2001.

BASTOS, E.M.A.F., GALBIATI, C., LOUREIRO, E.M. & SCOARI, D.O. 2011. Indicadores físico-químicos e atividade antibacteriana de própolis marrom frente à Escherichia coli. Arquivo Brasileiro de Medicina Veterinária e Zootecnia, 63: 1255- 1259.

BOSIO, K. et al. In vitro activity of propolis against Streptococcus pyogenes. Lett Appl Microbiol, v.31, n.3, p.174- 177, 2000.

CARVALHO V.S., ARAÚJO B.R., VASCONCELOS T.C., CHIMINAZZO C., COSTA NETO A.O., AYRES M.C.C., GUIMARÃES J.E. & COSTA J.N. 2012. Evolução clínica e avaliação de parâmetros leucocitários e de proteínas de fase aguda na pododermatite infecciosa ovina. Pesquisa Veterinária Brasileira. v. 32, n. 12, p. 1289-1296,  Dec.  2012.  

COELHO, M. C. S. C.; SOUZA, V. C.; COELHO, M. I. S.; CUNHA, M. P.; MEDINA, F. T. Aspectos sanitários de rebanhos caprinos e ovinos criados em assentamentos no município de Petrolina-PE. Revista Semiárido De Visu, v. 1, p. 32–40, 2011.

CUSHNIE, T., LAMB, A.J. Antimicrobial activity of flavonóides. Journal of Antimicrobial agents, v.27, n.2, p. 181-194, 2006.

FERNANDES JÚNIOR, A. et al. Atividade anti Staphylococcus aureus de extratos de própolis (EP) de Apis melífera preparados com diferentes concentrações de etanol como extrator. Rev Ciênc Farm, v.24, n.2, p.147–152, 2003.

JESUS, R. A. DE; BERGO, D.; RODRIGUES, F. L.; SABEC, G. Z.; MARCUSSO, P. F. Uso de medicamentos homeopáticos na pododermatite em ovinos da raça santa inês – relato de caso. Revista de Ciência Veterinária e Saúde Pública, v. 4, n. 2, p. 211-219, 1 mar. 2018.

NOBREGA, Adilson. Novo Censo Agropecuário mostra crescimento de efetivo de caprinos e ovinos no Nordeste. Embrapa Ovinos e Caprinos, 2018. Disponível em: https://www.embrapa.br/cim-inteligencia-e-mercado-de-caprinos-e-ovinos/busca-de noticias/-/noticia/36365362/novo-censo-agropecuario-mostra-crescimento-de-efetivo-de-caprinos-e-ovinos-no-nordeste. Acesso em: 28/11/2019.

PARK, Y. K. et al. Própolis produzida no sul do Brasil, Argentina e Uruguai: Evidências fitoquímicas de sua origem vegetal. Ciênc Rural, v.32, n.6, p.997-1003, 2002.

PINTO, M.S. et al. Efeito de extratos de própolis verde sobre bactérias patogênicas isoladas do leite de vacas com mastite. Braz J Vet Res Anim Sci, v.38, n.6, p.278-283, 2001.

SANTANA, A.F., LIMA, M.C., CRUZ, G.A.M. et al. Avaliação da ação cicatrizante da Jurema Preta (Mimosa tenuiflora willd.) nas lesões causadas por pododermatite em ovinos. PUBVET, Londrina, V. 2, N. 36, Set2, 2008.

SILVA SOBRINHO, A.G. et al Utilização da própolis no tratamento curativo da pododermatite necrótica em ovinos. 2004. Disponível em: < http://www.apacame.org.br/mensagemdoce/56/artigoprópolis.ht m>. Acesso em: 28/11/2019.

SFORCIN, J.M. et al. Seasonal effect on Brazilian propolis antibacterial activity. J Ethnopharmacol, v.73, n.1-2, p. 43- 249, 2000.

STEPANOVIC, S. et al. In vitro antimicrobial activity of própolis and synergism between própolis and antimicrobial drugs. Microbiol Res, v.158, n.4, p.353-357, 2003.

TEIXEIRA, W. C.; SANTOS, H. P.; SILVA, J. C. R.; RIZZO, H.; MARVULO, M. F. V.; CASTRO, R. S. Perfil zoosanitário dos rebanhos caprinos e ovinos em três mesorregiões do estado do Maranhão, Brasil. Acta Veterinaria Brasilica, v.9, n. 1, p. 34–42, 2015.

YANG, H., HO, W.L., CHANG, C.M., et al. Antibacterial activity of propolis ethanol extract against Streptococcus mutans as influenced by concentration, temperature, pH and cell age. Journal of food and drug analysis, v. 15, n. 1, p. 75-81, 2007.

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